domingo, novembro 05, 2006

Deitou e ficou ali, quietinho, enrolado no cobertor xadrez. Tentou fechar os olhos, mas achou melhor deixá-los abertos, para ver o momento em que ELES chegassem. Mexia as sobrancelhas, impaciente, tentando de alguma forma acomodá-las. Sempre pensou que sobrancelhas eram coisas sem utilidade nenhuma. Não tinham FUNÇÃO, nem protegiam contra nada. Estavam apenas ali, acima dos olhos, esses sim, essenciais. Mas SOBRANCELHAS? Para ele não fazia diferença tê-las ou não. Era apenas mais um peso que os olhos carregavam. Tinha o rosto inerte mesmo, sem expressão, sem grandes surpresas.

Os dedinhos tateavam a borda do cobertor, como se tentassem identificar alguma IMPERFEIÇÃO, algum fio solto, algo em que pudesse prender a atenção. Mas nada. A ansiedade tomava conta dos ouvidos e das idéias. Começou a roçar os pés um no outro, fazendo um SUTIL barulho de pele ÁSPERA e granulosa. Logo parou. Preferia o silêncio do quarto, com todos os seus microbarulhos. A madeira estalando. O vento criando vozes tristes e batendo na janela. O cupim gulosamente corroendo os móveis. E o silêncio.

Resolveu mudar de posição. Deitou-se de lado, com o olhar diretamente para a porta. Não agüentava mais esperar que ELES dessem algum sinal de vida. Não gostava de dormir sozinho. Encolheu as pernas, juntando os joelhos e abraçou o travesseiro. Fechou os olhos por um segundo, voltando a abrí-los logo em seguida. Definitivamente, queria vê-los quando chegassem. Sentir a forma, descobrir se tinham CHEIRO, se viriam vestidos ou despidos de pudores e CORES. Se ainda lembravam do passado. Desejava que não. Talvez lhe trouxessem chocolate. Não sentia o GOSTO doce disso há tanto tempo. Queria saber se tinham idade e tempo de vida delimitado também, porque sempre ouvia as pessoas dizerem que eles não duravam muito.

De repente, viu a porta abrir levemente. Não tinha certeza. Devia ser a ansiedade. Achou que estivesse vendo coisas. Talvez tenha deixado alguma janela aberta, e o vento esteja empurrando a porta. Não sabia se continuava olhando, se fechava os olhos. Na DÚVIDA, não os fechou. Queria ver! As PUPILAS dilatavam-se na escuridão do quarto, tentando identificar algo.

Ficou calmo e respirou fundo. Agora tinha CERTEZA. Eles estavam por perto. A porta abriu-se levemente, sem fazer ruído, formando uma pequena fenda por onde um rato poderia passar com sobra de ESPAÇO. Não precisavam de mais do que isso. Não via nada, embora olhasse fixamente para a porta. Forçava a visão, mas de nada adiantava. Só que podia sentir a presença deles. Sabia que estavam ali. Sentiu o corpo AMOLECER, aos poucos. E os músculos tornarem-se menos RÍGIDOS e sem força. Enfim, entregou-se. Fechou os olhos, e deixou que tomassem conta do resto. Efêmeros, assim como as pessoas diziam, e sem fazer grandes escândalos, os sonhos finalmente chegaram.

3 Commentários:

Anonymous Anônimo disse...

Ameii!!!
Bjão

domingo, 05 novembro, 2006  
Anonymous Anônimo disse...

Adorei :) fiquei ansiosa pra saber o final, muito bom de ler! beijinhosss

domingo, 05 novembro, 2006  
Anonymous Anônimo disse...

Ótimo texto. Sublime.

segunda-feira, 13 novembro, 2006  

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